sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Cinco Minutos – José de Alencar



“É uma história curiosa a que lhe vou contar, minha prima”.

Cinco Minutos – José de Alencar

José de Alencar é sem dúvida nenhuma, um dos melhores nomes do Romantismo no Brasil, autor que, extremamente ufanista, quando criticado pela sua forma de utilizar a língua, diferente da forma clássica europeia, argumentou dizendo que estava escrevendo em outro português, o português do Brasil.

Cinco Minutos, que eu estou resenhando essa semana, é o primeiro romance urbano do autor, curtinho, e geralmente nas edições disponíveis nas livrarias e bibliotecas ele vem acompanhado de A Viuvinha, outro romance do autor. Cinco Minutos é um doce de romance, daqueles meio água com açúcar (e talvez haja quem o desmereça), mas engana-se quem pense que trata somente disso. Tudo é mostrado pela visão de Pedro (o protagonista) que envia uma carta a sua prima, sobre como conheceu sua amada, de que forma os dois se apaixonaram por um acaso simples do destino.

Como todo bom romance romântico, até o casal se reunir, uma série de coisas acontecem ao longo da história – e isto é um charme da época e cria uma tensão por todo romance. Em certo ponto da narrativa chega-se a imaginar que o casalzinho acabará não ficando junto. Será que eles ficam juntos, inclusive?

Pedro estava indo atrás de um ônibus, para ir ao Andaraí, que acabou perdendo, pois havia partido há cinco minutos. Cinco exatos minutos, Obrigado a esperar o próximo, é no ônibus seguinte que ele sobe, senta-se, e depara com uma mulher que está com o rosto escondido. Os dois então estabelecem um contato, porém, coisa de poucos segundos, e logo a mulher se afasta. Aqui abro um parênteses: o romance tem bem a ver com a sociedade da época, os costumes, a maneira como a mulher era vista. O papel do homem. É dentro do ônibus, por cinco minutos, que Pedro conhece Carlota.

Antes de sair à Carlota murmura “Non ti scordar di me!” e desce. Há uma criação de uma tensão, que perpassa toda a narrativa. Pedro conta à prima o que se passou e depois que ficara um bom tempo sem encontrar a moça por quem acabara de se apaixonar, e ainda tem a dúvida, pois a moça estranhamente já parecia conhecê-lo. É um testemunho bonito de se ver, o entusiasmo como que Pedro fala sobre a vontade reencontrar a moça, o amor é tratado de uma forma serena e bonita.

De novo, como todo bom romance romântico, Cinco Minutos apresenta uma trama rocambolesca, que segura o leitor da primeira a última página. Primeiro, se ele encontrará Carlota ou não? Depois Carlota envia uma carta, apenas dizendo que tem um motivo para se ocultar, mas não revela esse motivo, o que provoca a raiva de Pedro. Ainda depois, quando a moça revela que está com uma doença e que tem poucos dias de vida, Pedro se desespera, e o leitor não sabe se os dois ficarão juntos afinal, ou se Carlota vai morrer. A trama bem atada, enfim, é o que te prende à leitura.

Diria Antonio Candido, em seu ensaio “O Direto a Literatura” publicado no seu livro Literatura e Sociedade, que Literatura é forma: forma de palavra, forma de expressão e forma de conhecimento. Cinco Minutos atende tranquilamente estas três formas. Forma de palavra é uma viagem a um português arcaico, cheio de formas formais, regras gramáticas que caíram do uso, mas que na época em que o livro foi escrito correspondia à forma com que as pessoas se comunicavam. Forma de expressão trata-se do primeiro romance urbano de José de Alencar, a imagens do Rio de Janeiro da época; o autor traz todo o seu estilo e as coisas que ele queria dizer ao mundo nesse romance, (coisas essas melhores problematizadas em outro romance do autor, muito mais conhecido e até um pouco odiado, que se intitula Senhora); e por fim, forma de conhecimento, uma vez que Cinco Minutos, lido atualmente por nós, é uma doce viagem no tempo a um Brasil tão desconhecido de nós, uma doce viagem a uma época tão diferente da nossa, os costumes, as influências advindas da Europa etc.

Arrisco dizer que Cinco Minutos é o preâmbulo da grande obra de José Alencar, o já referido romance Senhora.

Há quem critique esses romances água com açúcar, assim como toda a fase do Romantismo, ou até mesmo os escritores clássicos da literatura brasileira (como a senhorita Dornelles fez na resenha especial dela na quarta-feira). Como a literatura brasileira é uma das minhas paixões, posso ser suspeito pra falar, mas devo dizer que para apreciar estes livros precisamos enxergar-los como uma aula de história, como um retorno a um passado. E devemos fazer isso de livre e espontânea vontade, sem a pressão da escola, que obrigando as pessoas a ler, acaba afugentando os alunos destes livros tão bons, bem escritos e cheios de coisas boas para serem encontradas.

Indico Cinco Minutos porque, este romance em particular é um doce testemunho, mas, além disso, é uma forma de pensar numa sociedade de anos atrás, tão diferente da nossa, tão rica e que nos influencia até hoje. Enfim, indico Cinco Minutos, e espero que você o leia com outro olhar, perceba sua linguagem tão rica, e tente fazer essa tal “viagem no tempo” que eu falei.
Garanto que valerá a pena.

“Assim passei nove dias na Tijuca, vivendo uma vida estúpida quanto pode ser: dormindo, caçando e jogando bilhar.
Na tarde do décimo dia, quando já me supunha perfeitamente curado e estava contemplando o sol, que se escondia por detrás dos montes, e a lua, que derramava no espaço a sua luz doce e acetinada, fiquei triste de repente.
Não sei que caminho tomaram minhas ideias; o caso é que daí a pouco descia a serra no meu cavalo, lamentando esses nove dias, que talvez me tivessem feito perder para sempre a minha desconhecida.
Acusava-me de infidelidade, de traição, a minha fatuidade dizia-me que eu devia ao menos ter-lhe dado o prazer de ver-me.
Que importava que ela me ordenasse que a esquecesse? Não me tinha confessado que me amava, e não devia resistir e vencer essa fatalidade, conta a qual ela, fraca mulher, não podia lutar?
Tinha vergonha de mim mesmo; achava-me egoísta, cobarde, irrefletido, e revoltava-me contra tudo, contra o meu cavalo que levara à Tijuca, e o meu hóspede, cuja amabilidade ali me havia demorado.
Com esta disposição de espírito cheguei à cidade, mudei de traje e ia sair, quando um moleque me deu uma carta.
Era dela.”

Indicação do Aion
[nos perderemos entre monstros, da nossa própria criação]

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