“as pessoas têm medo de mudar.”Uma literatura rápida, crua, acidentada, experimental. Bret Easton Ellis possui um jeito próprio de escrever. Quando explodiu nos anos 80 sofreu bastantes críticas pelos intelectuais de plantão. Bom, nada anormal.
Abaixo de Zero trata-se do primeiro romance do autor. A história é fácil, o enredo é simples, a leitura é uma bala, uma porrada. É daquelas que você começa e simplesmente não a sente. Apenas vai, vai, vai, e quando menos percebe, já leu 80 ou 100 páginas.
A história centra-se em Clay, o protagonista. Clay é um jovem de família rica, que em férias da faculdade, volta para a cidade em que vive sua família e amigos, Los Angeles. Sem muita pretensão na terra, Clay reencontra também uma antiga namorada. Todos os jovens são absurdamente ricos, filhos de diretores ou roteiristas de Hollywood, mas, porém, são completamente depravados, sem rumo ou qualquer ambição. Vivem o hoje, e da forma mais intensa possível. Clay, apesar de seu ar misantrópico, passa por diversas crises existenciais, principalmente na relação familiar, e também com amigos e Blair, sua ex-namorada. O livro retrata doses de sexo, festas, dinheiro, e drogas. Muitas drogas. Apresentando o vazio e inconsequência existencial de toda essa juventude. Tudo mostrado de forma completamente natural. É considerado como um retrato frio daquela que foi a geração dos anos 80. O livro não possui uma história única e fixa, e sim diversas histórias paralelas, como se fosse de fato um retrato de um cotidiano. Então é difícil falar sobre o enredo aqui, pois são vários, um amontoado de acontecimentos. Quando acaba uma nuance, começa outra, e todas centradas no estilo de vida rápido e feroz de seus personagens, inclusive mostrando consequências que conforme o desenvolvimento do livro transformam os personagens e suas relações.
“As imagens que eu tinha eram de gente enlouquecendo por morar nesta cidade. Imagens de pais tão famélicos e frustrados que comiam seus próprios filhos.”
Outra coisa do livro são os diálogos, que nunca se estendem muito. São breves, inteligentes, porém, não são intelectuais ou utópicos. São bem próximos da realidade. Daqueles diálogos que nós mesmos tempos com nossos amigos. Talvez essa seja uma das coisas que mais me agrade no livro, que é a relação dele com o cotidiano, a realidade. Nada de personagens utópicos como estamos tão acostumados a ver. Tudo é da forma mais crua e nua possível. É uma obra cheia de referencias de músicas ou filmes, como estar numa festa e tocar tal música, ou o pessoal se reunir para ir ver tal filme. Ou até mesmo ligar a TV na MTV esperando para ver aquele clipe de tal banda. Ir a shows e etc. Enfim, algo que todos os jovens fazem e procuram. Procuram a ação, o movimento. Vamos fazer algo. Nada de ideais. Eu quero velocidade!
Uma curiosidade é que quando Bret Easton Ellis lançou o livro, ele tinha 20 anos, ou seja, praticamente a mesma idade dos personagens.
Abaixo de Zero é uma obra visceral, infernal, rápida, mórbida e fria. Não há muito que dizer. Foi um livro que demorou dias pra sair da minha cabeça. Você sente uma foice no peito quando termina a leitura. É impossível não sentir um pouco do desespero em cada um de nós. Onde está a minha cabeça?
“As pessoas têm medo de mudar de pista nas vias expressas de Los Angeles. É a primeira coisa que ouço quando volto a esta cidade. Blair me apanha no aeroporto e resmunga isso baixinho, enquanto o carro sobre a rampa que dá para o viaduto. Ela diz: “As pessoas têm medo de mudar de pista nas vias expressas de Los Angeles”. Embora essa frase não devesse me preocupar, fica em minha mente por um tempo longo e desagradável. Nada mais parece me interessar. Nem o fato de eu ter dezoito anos e de ser dezembro, de a vinda no avião ter sido turbulenta e de o casal de Santa Bárbara, sentado à minha frente na primeira classe, ter tomado um belo porre. Nem a lama que borrou as pernas do meu jeans, meio largo e gelado, no início do dia num aeroporto em New Hampshire. Nem a mancha na manga da camisa úmida e amarrotada que estou usando, camisa que, hoje de manhã, parecia fresca e limpa. Nem o rasgão na gola do meu colete cinza com losangos estampados que, de certa forma, parece, agora, mais oriental do que antes, principalmente quando próximo à camiseta azul-clara e ao jeans apertado e liso de Blair. Tudo isso parece irrelevante diante dessa única frase. Parece ser mais fácil ouvir que as pessoas têm medo de mudar do que “Estou certa que Muriel está com anorexia”, ou que o cantor da rádio berra através de ondas magnéticas. Nada mais me interessa a não ser essas catorze palavras. Nem o vento cálido, que parece impulsionar o carro pelo asfalto vazio, ou o cheiro atenuado de maconha que ainda impregna de leve o carro de Blair. No fundo, tudo se resume em eu ser um rapaz que vem para casa passar um mês e encontra alguém que não via há quatro meses e “as pessoas que têm medo de mudar.”
That’s all, folks!
Indicação do Luiz A. Jr.
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