segunda-feira, 22 de outubro de 2012

1984 - George Orwell


1984 é uma indicação que particularmente eu tenho um tanto de receio de fazer, assim tão de supetão. George Orwell é definitivamente meu autor favorito e eu ficaria imensamente triste se eu não conseguisse passar o quão excelente é a sua obra e nem o quão complexa. Embora seja injusto não mencionar seus outros clássicos como Keep the Aspidistra Flying e Animal Farm, não é por outra razão que não Nineteen-Eighty-Four que Orwell (pseudônimo para Eric Arthur Blair) sagra-se como o rei do futuro distópico.

A obra, que influenciou todos (e digo sem medo de errar) os clássicos distópicos vindos depois, faz parte juntamente com Admirável Mundo novo, de Huxley, e Laranja Mecânica, de Burgess, da tríade do futuro sem esperança, de sociedades corrompidas, distorcidas, animalescas.


Em 1984, Orwell traz à tona com tal maestria o medo do ser humano de ser corrompido, alienado, trabalhado e construído pelo sistema, que é impossível não se apaixonar logo nas primeiras páginas. A história (publicada pela primeira vez em 1949) trata de uma sociedade coorporativista e totalitarista no hipotético e longínquo ano de 1984. Winston Smith, seu protagonista, é um membro inferior do IngSoc (palavra em novilíngua para Socialismo Inglês), partido totalitarista que domina a Oceânia. Winston trabalha no Ministério da Verdade, repartição governamental que é responsável por adulterar a informação que chega aos membros do partido de acordo com o que é mais conveniente informar. Dessa forma, Winston, responsável por adulterar notícias nas quais deveria acreditar sem pensar nas consequências de seus atos, é trabalhado por George Orwell como o perfeito insatisfeito. Smith não só se incomoda com aquilo que adultera como também se incomoda que seus irmãos de partido não enxerguem a óbvia manifestação da verdade: o controle de mão de ferro do Partido. O personagem é um dos exemplos de angústia mais bem retratado da história da literatura.


Seria simples revoltar-se se não houvesse todo o drama perfeitamente construído pelo autor, o drama do controle. Cada centímetro de onde Winston vive e trabalha é vigiado e alscutado por equipamentos denominados teletelas, que ao mesmo tempo que transmitem informações partidárias que podem ter passado pelas mãos de Smith, vigiam e controlam toda e qualquer atitude suspeita dos irmãos do IngSoc. Winston está perdido então entre se incoformar e não se crer louco - e sozinho.


Não vale a pena dar mais detalhes de como a história se desenvolve - porque não julgo o enredo a parte mais importante do livro. A grande sacada de Orwell - que faz merecer o título de rei da distopia - é a criação do mundo hipotético de 1984. O autor trabalha à perfeição todos os nossos medos, colocando-os no aspecto certo do mundo da Oceânia de 1984 (Winston não tem certeza do ano - bem como não tem certeza de nada). A criação do partido, das engrenagens sociais, da repressão, dos detalhes sensacionais como Os Dois Minutos de Ódio e também da novilíngua - a ser mencionada no fim da resenha - são aspectos da genialidade de George Orwell trabalhada em Nineteen-Eighty-Four, que, embora como ano já esteja distante, nunca deixará de ser uma possibilidade de futuro a pairar sobre nossas cabeças.
A sociedade do Grande Irmão, a grande figura do partido (Big Brother, que numa interpretação mais correta seria algo como o "Irmão mais velho") é uma sociedade profundamente doente - e também o é Winston, que embora deseje liberdade não consegue e nunca conseguirá lutar contra ela. O final - daqueles que fazem faltar ar - é o retrato disso.


O livro ganhou adaptações cinematográficas, sendo a minha favorita a de 1984, que tem John Hurt no papel de Smith. É importante reservar um parágrafo para falar da novilíngua (ou novafala). Não bastasse só toda a genialidade do autor em criar o mundo distópico de 1984, ainda há espaço para um idioma nele utilizado. A novafala é simplesmente genial em sua essência: é uma língua derivada do inglês que conhecemos, mas que tem uma característica peculiar, diminuindo o número de palavras disponíveis a cada ano. Em novinlíngua, não é possível pensar e escrever frases que são contrárias à ordem do partido - pelo simples fato de que as palavras para tanto não existem. Objeto de muitos estudos linguísticos depois, a novilíngua é o diamante da coroa que 1984 e Orwell levam no mundo da literatura de ficção.

"Às vezes ele conversava com ela sobre o Departamento de Registros e as fraudes desavergonhadas que cometia em seu trabalho. Essas coisas não pareciam horrorizá-la. Ela não sentia o abismo abrir-se debaixo de seus pés ao pensar em mentiras que se tornam verdades. Ele contou a história de Jones, Aaronson e Rutherford e do momentoso pedaço de papel que um dia foi parar em suas mãos. Ela não ficou nem um pouco abalada. No início, para falar a verdade, nem entendeu direito do que ele estava falando.- Eles eram seus amigos? - perguntou.- Não, eu nem os conhecia. Eram gente do Núcleo do Partido. Além disso, muito mais velhos que eu. Eram dos velhos tempos, de antes da Revolução. Eu só os conhecia de vista, e de passagem.- Então porque tanta preocupação? As pessoas são mortas o tempo todo, não é mesmo?"

Guardo algumas linhas pra falar de edições e traduções. Eu - que já li todas - não acredito que alguma delas deixe a desejar para o original em inglês - que eu também já li. As edições mais antigas tem uma escrita um pouco mais difícil e menos fluida, que pode incomodar o leitor menos hardcore. Para esses, eu recomendo a nova edição e tradução, cuja capa é a do post.

Indicação (dupla indicação) da Amanda.

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