Falar do caos agora deve ser apropriado ao contexto desse 2013, que começou mais polêmico que mamilos. Ok, piada horrível.
Mas eu mesmo assim vou falar de caos. Não é o caos ou o colapso mundial, mas o micro-caos no micro-cosmo de Johnathan Noel, protagonista e único personagem importante de A Pomba, livro de Patrick Suskind (mesmo autor de O perfume – a história de uma assassino, resenhado aqui:http://migre.me/dWvp0). Tem pouco mais de 100 páginas, letra grande, daqueles que dá pra ler numa só viagem do ônibus casa-faculdade.
Noel é um homem cujas experiências da vida o derrubaram. Depois de alguns desapontamentos, torna-se totalmente avesso às novas experiências, avesso a qualquer coisa que o tirasse de sua rotina cuidadosamente construída. Depois do fim de um casamento frustrado, quando sua esposa foge dele com um artista, ele se muda para Paris e arruma emprego como um segurança de um banco.
Quando o encontramos, ele está em vias de se aposentar. Em Paris, ele alugou um quarto, o mobiliou, e agora está juntando os últimos francos para finalmente compra-lo. O quarto é o único lugar em que se sentiu confortável, que nunca o traíra, propondo novas experiências, o único que sempre lhe permanecera fiel: o símbolo de sua rotina meticulosamente construída.
Noel conta os minutos em sua rotina, à uma maneira Phileas Fogg, de A Volta ao Mundo em 80 dias. Metódico, com sua rotina sem surpresas, Noel é um homem seguro em vias de sua aposentadoria e dominado pelo desejo de permanecer em seu quarto, sem novas surpresas.
Sua existência é pacata, e poderia se dizer que o autor tenta o tempo todo destacar o quão vazia também é. De fáceis palavras, letra grande, narrado por um narrador onisciente, o romance vai mais rápido que o Ligeirão (e que a piada seja perdoada).
Tudo vai bem até o dia em que Johnathan Noel encontra uma pomba na frente de sua porta quando ele saía para o trabalho. Uma pomba branca, que havia cagado em todo o corredor e espalhado penas brancas por todos os lados. A pomba, de frente para o próprio Noel, o encara com os seus grandes olhos. E isso é suficiente para o mundo de Noel entrar em total colapso.
Uma obra definitiva do caos, é A Pomba. Um mestre do caos, Patrick Suskind. E se você acha que uma pomba jamais teria tanto poder sobre um homem, essa é a obra certa.
“Só quando chegou ao patamar da escada foi que parou por um momento, para fechar o incômodo guarda-chuva e lançar um olhar para trás: os claros raios do sol da manhã entravam pela janela, moldando um bloco de luz de nítido contorno à sombra do crepúsculo do corredor. Quase não se podia enxergar através dele, e somente quando Johnathan piscou os olhos e fez força para olhar foi que viu a pomba soltar-se do canto bem escuro lá do fundo, dar alguns rápidos e inseguros passos para a frente e, então, voltar a sentar-se outra vez, exatamente diante da porta de seu quarto.
Virou de costas horrorizado e desceu a escada. Nesse momento, Johnathan teve a certeza de que nunca mais poderia retornar.”
Indicação da Amanda.
Bjaum pra vocês.
[you see, but you don’t observe]
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