“Quando plural e original podem ser sinônimos...”Ao abrir o livro que eu estou resenhando essa semana me deparei com um comentário de Olavo Bilac, sobre Augusto dos Anjos. O livro não traz nenhuma confirmação, apenas cita na introdução (na edição pocket da Lpm, para quem quiser confirmar) uma fala de Bilac,desdenhando o trabalho de Augusto dos Anjos.
Não tenho muito apreço pelo Olavo Bilac, e este não é assunto pra agora, o fato é que Olavo Bilac, considerado Príncipe dos Poetas, esteve a frente de uma escola literária brasileira que muitos devem conhecer chamada parnasianismo, Augusto dos Anjos viveu mais ou menos por aquela época, mas pertence a um período literário que não o de Bilac: O pré-modernismo, que como sugere a nomenclatura, é a produção literária que engloba os escritores e o mercado editorial que antecede o modernismo brasileiro, é uma fase de transição, O que configura que Augusto dos Anjos tenha a formalização e a perfeição advindas do Parnasianismo, movimento de Bilac, mas seja mais do que somente isso.
Eu e outras poesias, presente em várias edições, é a única obra publicada de Augusto dos Anjos, que morreu por volta dos 30 anos, e seguiu vários anos ignorado pela critica literária, Felizmente, e a introdução do referido livro comenta isso, a terceira edição de 1928 vendeu bem, e os gostos literários mudaram, ainda mais com a semana de 22, os anos da guerra, o que ajudou a não só divulgar a poesia de Augusto, mas também de alça-lo ao posto de um dos mais célebres poetas de literatura brasileira.
Por certo, você me perguntaria: Mas Aion? O que tem nessa poesia de tão fascinante, tanto, que você esta não só resenhando, mas indicando esse livro para que eu leia. E aí eu te respondo: Tem tudo e não tem nada. Augusto dos Anjos, como eu comentei, viveu em um período de transição, antes do Modernismo explodir como movimento literário, Augusto exprime em suas poesias, muito da poesia formal sugerida pelo parnasianismo, a tal arte pela arte, mas não é só isso, Augusto traz mais, traz temas de interesse, apresenta poemas mais extensos, falando sobre sombriedades, sobre a vida, sobre a morte, sobre o amor, o tema universal que todo o poeta que se preze fala.
Complexo, genial e principalmente original, é difícil inserir Augusto dos Anjos, seja aonde ele é inserido normalmente pela critica literária, no Pré Modernismo, seja inseri-lo no Parnasianismo, ou até mesmo, chegamos a confundir as coisas e pensar que ele é um poeta importado lá da segunda geração do romantismo, e que devia ser amigo do célebre Álvares de Azevedo, Tudo isso gera uma confusãozinha básica, até mesmo pra quem não estuda literatura e só lê essas maravilhas, porque? Porque Augusto dos Anjos é plural, ele é muitos poetas em um só, ele é parnasiano, é romântico, é pré-modernista, é modernista, é barroco, é simplesmente fantástico, e toda essa pluralidade pode ser observada de forma excepcional no livro Eu, que reúne os poemas que Augusto escreveu por toda a sua vida.
Os temas sombrios, nos remetem ao amor da segunda geração do romantismo, mas todos eles tem um quê de novidade, um quê, de algo a mais, de originalidade.
Você inclusive deve conhecer Augusto dos Anjos, não? Talvez estes três versos ajudem: Vês! Ninguém assistiu ao formidável/Enterro de tua última quimera./Somente a Ingratidão - esta pantera , Lembrou? Das aulas de literatura? De alguma citação que você viu em algum livro? Não? Você deve ter lembrado... Sabe por que? Porque a originalidade de Augusto dos Anjos é tamanha, que não só o poeta tornou-se um dos mais célebres poetas já vistos no Brasil, como os três versos aos quais eu fiz menção, pertencentes ao delicioso soneto Versos Íntimos, tornaram, de certa forma, uma referência clássica quando se fala de literatura brasileira. E isso só corrobora com tudo que eu disse até aqui: Augusto dos Anjos é simplesmente maravilhoso e você, meu pequeno jovem leitor, deve se entregar ao prazer da leitura, e descobrir sozinho porque Augusto dos Anjos é tão maravilhoso...
Segue, é claro, na integra o soneto Versos Íntimos, e logo abaixo um trecho de outra célebre poesia do autor: Monólogo de uma sombra.
“Vês! Ninguém assistiu ao formidávelEnterro de tua última quimera.Somente a Ingratidão - esta pantera -Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!O Homem, que, nesta terra miserável,Mora, entre feras, sente inevitávelNecessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!O beijo, amigo, é a véspera do escarro,A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,Apedreja essa mão vil que te afaga,Escarra nessa boca que te beija!”
"Sou uma Sombra! Venho de outras eras,Do cosmopolitismo das moneras...Pólipo de recônditas reentrâncias,Larva de caos telúrico, procedoDa escuridão do cósmico segredo,Da substância de todas as substâncias!
A simbiose das coisas me equilibra.Em minha ignota mônada, ampla, vibraA alma dos movimentos rotatórios...E é de mim que decorrem, simultâneas,A sáude das forças subterrâneasE a morbidez dos seres ilusórios!
Pairando acima dos mundanos tetos,Não conheço o acidente da Senectus- Esta universitária sanguessugaQue produz, sem dispêndio algum de vírus,O amarelecimento do papirusE a miséria anatômica da ruga!
Na existência social, possuo uma arma- O metafisicismo de Abidarma -E trago, sem bramánicas tesouras,Como um dorso de azémola passiva,A solidariedade subjetivaDe todas as espécies sofredoras.”[...]
Por fim, gostaria de declarar, que resenhar poesia pode ser por vezes difícil e complicado. Por quê? Porque é difícil em poucas linhas, falar com propriedade de algo tão maravilhoso, então espero, e tento sempre, instigar quem acompanha as resenhas, para que a pessoa sozinha consiga encontrar todas as coisas que eu encontrei, ou até mais coisas, e assim aproveitar ainda mais do livro resenhado.
Indicação do Aion.
[chega de chegar, depressa é muito devagar]
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