sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Sentimento do mundo - Carlos Drummond de Andrade


“Tenho apenas duas mãos, e o sentimento do mundo.”
As pessoas às vezes me perguntam qual é o meu autor favorito. Acho uma pergunta um pouco difícil de responder porque eu ainda não consegui ler nem a metade das coisas que eu gostaria e sei que infelizmente não conseguirei. Então arrisco responder com o nome de alguns autores que tem o meu apreço,aqueles que eu gosto mais, e é claro que um deles é o mestre Carlos Drummond de Andrade.

Lembrando que esta é uma página de indicações de livros, vou indicar a todos um dos melhores livros do Drummond, um dos maiores poetas que o mundo já conheceu, o volume “Sentimento do mundo”, que é uma coletânea de poemas publicada pela primeira vez em 1940 na qual constam diversos poemas de Drummond e podemos perceber o quão maravilhoso ele é, assim como a sua poesia.

Drummond, da terceira geração da poesia modernista, é sem dúvida nenhuma um dos maiores poetas brasileiros, inclusive essa minha afirmação só revela que ele é um dos meus escritores favoritos. Ele tem uma poesia melancólica - que fala sobre o amor por algumas vezes com algum tipo de gracejo que acaba arrancando algumas gargalhadas, por outras triste, dessas que nos deixam a refletir após terminar sua leitura e com alguma crítica social, tendo a ver com o momento que Drummond os escreveu, no contexto da segunda guerra mundial.

Quando se imagina o contexto histórico em que o livro foi publicado e quando os poemas foram escritos, o livro ganha um sabor a mais, enquanto pipocavam os ecos do fascismo e do nazismo, a guerra civil espanhola, a Segunda Guerra Mundial, o governo de Getúlio Vargas, Drummond se angústia com tudo aquilo e de alguma forma isso se reflete em sua poesia. Daí, as poesias de critica social que também aparecem no livro.

“Sentimento do mundo” é uma prova viva disso, tem tudo que Drummond tanto deixa transparecer em sua poesia, tem todos os elementos que o tornam ele tão grandioso; há uma sinceridade muito grande em tudo que ele expressa.
Há um jogo de emoção muito forte, um poeta que joga no papel tudo aquilo que nós também pensamos mas que não temos coragem de dizer. Há amor, desilusões amorosas; existe também um trabalho maior com a dor e como tentar traduzi-la em palavras.

Existem poemas que nos deixam pensando é impossível ficar indiferente ao ler “Sentimento do mundo”, arrisco dizer que é impossível não despertar um amor a Drummond quando folheamos suas páginas, quando deparamos com sua linguagem, com as coisas que ele fala, com a melancolia, por vezes quando nos deparamos com coisas simples, que acontecem conosco, mas que Drummond coloca no papel de forma tão graciosa, tão boa, tão bem feita.

É inclusive nesse livro, que um dos mais famosos poemas de Drummond aparece: “Quadrilha” que eu faço questão de transcrever na integra aqui:

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história

Ao ler quadrilha não consigo imaginar uma só pessoa que não consiga enxergar um pouco de genialidade nesse poema, que mistura tantas coisas de Drummond, é simplesmente fantástico.
Bem, recomendo sempre e sempre, não só esse livro, mas qualquer poema de Carlos Drummond de Andrade. Para quem não conhece Drummond, talvez seja interessante começar com “Sentimento do mundo”. Para quem já conhece, Sentimento é uma grande coletânea e vale muito a pena ler e reler. Há sempre algo novo a ser encontrado, há sempre alguma coisa que passou despercebida da primeira vez que se leu.
Recomendadíssimo.

Como é de costume, vou colocar ao final um trecho do livro, aqui vai um trecho de “O amor bate na aorta” na minha humilde opinião, um dos melhores poemas de Drummond:


“[...]
Olha: o amor pulou o muro
o amor subiu na árvore
em tempo de se estrepar.
Pronto, o amor se estrepou.
Daqui estou vendo o sangue
que corre do corpo andrógino.
Essa ferida, meu bem,
às vezes não sara nunca
às vezes sara amanhã.

Daqui estou vendo o amor
irritado, desapontado,
mas também vejo outras coisas:
vejo beijos que se beijam
ouço mãos que se conversam
e que viajam sem mapa.
Vejo muitas outras coisas
que não ouso compreender...”


Indicação do Aion

[nos perderemos entre monstros, da nossa própria criação]

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