domingo, 16 de fevereiro de 2014

O limite de empréstimos

Por Aion Roloff

Joaquim entrou no salão. Era segunda-feira (sim, amanhã). Tudo que viu foram várias estantes, muitas estantes, insanamente estantes. E o que tinham nas estantes? Sim meus caros, livros! Ah, muitos livros, insanamente livros. Joaquim – ele me contou depois – Ficou maravilhado, extasiado, para um amante de leitura, que contava moedas para comprar edições de bolso, e assim ir aumentando uma modesta coleção, era muito, era mais do que o coração dele conseguia suportar.

De literatura americana, livros de história, passando por romances do inicio do século XX, Livros de capa dura, edições desgastadas pelo uso e pelo tempo, dicionários de italiano, inglês, francês, árabe... livros de lógica formal, capitalismo, socialismo, a eterna briga, revistas dos anos 60, capas históricas, o segurança bravo porque entrou na seção sem ser anunciado...

Joaquim desbravou cada estante, cada andar, cada pedaço do céu daquele lugar. Já havia ouvido uma vez, que o paraíso era uma espécie de livraria, agora parecia que tinha certeza, era mesmo. E o melhor! Era gratuito! Tudo que ele precisava era de uma carteirinha, a taxa de inscrição, e um comprovante de endereço. Tudo isso, e tudo aquilo seria dele!
Joaquim, me telefonou extasiado – mais uma razão pela qual me arrependi de ter dado meu numero a ele – Aion! Berrava ele no telefone, você precisa vir aqui, você nem imagina o que eu encontrei! Eles deixam levar para casa! Aion! Aion! Tudo que eu consegui pensar na minha cabeça foi o seguinte, meu caro Joaquim, você nunca foi numa biblioteca antes? Nunca mesmo? Ela estão espalhadas pela cidade, abarrotadas de livros, prontos para serem lidos e admirados, basta você entrar e se maravilhar.

O rapaz – filho não lembro de quem – já havia sim frequentado uma biblioteca, a modesta biblioteca de sua escola, onde havia um dois exemplares de livros infantis, a maior parte em edições condensadas, isso não por que a escola era ruim, ou agia de má vontade, era falta de recurso mesmo. Eu, cabeça dura e com pouca sensibilidade, estava me esquecendo que ele havia finalmente conhecido uma biblioteca de verdade. Normal estar daquele jeito, eu mesmo quando entrei pela primeira vez numa biblioteca dessas, grandes, enormes, cheias de livros, também perdi o fôlego. Mentira, quando olhei da rua, um prédio, um enorme prédio, só para livros, é muito melhor que uma livraria, mas infinitamente melhor.

Tudo que irritou Joaquim naquele dia, foi apenas uma coisa, ele que passou por todas a seções e andares da biblioteca, corredores e escadarias, escolhendo livros e mais livros, e mais livros, e mais livros, de maneira insana e ávida por leitura, chegou ao balcão de empréstimos, com nada menos que vinte exemplares – que acreditem, ele iria devorar em uma semana. A bibliotecária, uma simpática mulher de uns quase 30 ou 40 anos, ainda muito bonita, de maneira muito terna e cuidadosa, alertou o jovem Joaquim que aquele número infringia o limite de empréstimos, que ele só poderia levar 3 exemplares, mas os 17 que sobrassem ele poderia buscar em outras oportunidades. É claro que Joaquim achou aquilo um absurdo, e quem não acharia, não é mesmo? Como assim, vocês estão limitando o meu poder de leitura? Estão limitando as minhas aventuras literárias?

Calmamente, a bibliotecária explicou que não poderia liberar vinte exemplares, primeiro, porque havia um limite pré estabelecido, regido por normas internas daquele local, e também de qualquer outra biblioteca, e depois porque a biblioteca – pública – era de todos, ou seja, mais pessoas apaixonadas por leitura, assim como Joaquim, também gostariam de poder ler vários livros, e que o número de livros era sugestivo, e que Joaquim poderia pegar três, lê-los, devolver, e pegar mais três...
Pouco convencido, Joaquim teve que tomar uma das piores decisões de toda a sua vida, escolher apenas, e tão somente três livros, da lista maravilhosa que estava em suas mãos. Com muita dificuldade escolheu, depositou os três que levaria em cima do balcão, e prometeu a si mesmo que voltaria tão logo quanto possível buscar os outros.


*Essa crônica é baseada em fatos reais, não que Joaquim exista – bem talvez ele exista, creio que em minha memória, uma vez quando eu tinha sua idade, eu entrei numa biblioteca e fiz exatamente todas as coisas que Joaquim fez. E hoje, toda a vez que eu entro, me lembro do jovem Joaquim e sua paixão por livros e literatura, e isso piora com o tempo. 

Um comentário:

Anônimo disse...

E hoje em dia você não deixa o pessoal pegar mais de 5 livros na biblioteca da Reitoria.