segunda-feira, 5 de novembro de 2012

O Triângulo Rosa - Jean-Luc Schwab (Rudolf Brazda)


Encontro o Aion nessa segunda com mais um livro situado no contexto do nazismo alemão. Mesmo que O Triângulo Rosa não seja nada parecido com O Menino do Pijama Listrado em suas características temáticas e literárias, é impossível não comparar os acontecimentos provocados pelo universo nazista nas duas obras. 

Na entrada do campo de concentração de Bunchewald está escrito “jedem das seine”, um provérbio alemão que significa algo como “a cada um o que merece”. Foi a partir dessa premissa tão controversa que a história de Rudolf Brazda chegou até nós hoje como livro e como registro histórico. À época do livro com seus 97 anos, Brazda foi o último sobrevivente gay dos campos de concentração alemães e seu testemunho chega à comunidade literária através d’O Triângulo Rosa, escrito e narrado por Jean-Luc Schwab.

Apesar da escrita terrivelmente simplória (ainda não tive a oportunidade de verificar se a culpa é da tradução), das pouquíssimas 182 páginas (já acho poucas pra qualquer livro, ainda mais pra um livro de caráter biográfico) e da pouca atenção que se deu a ele na época do lançamento, Jean e Rudolf nos trazem importantes considerações e violentas quebras de alguns preconceitos atuais ao narrar a história de vida de Brazda, jovem alemão (tchecoslovaco por ascendência) que foi perseguido, condenado arbitrariamente e preso por sua orientação sexual.

Ao contrário do que se pode esperar, vamos ao encontro de Brazda com a interessante informação de que nem sua família, nem sua comunidade o discriminavam ou o apartavam por ser homossexual na década de 30. Jovem atraente no alto de seus 1m60 [risos], ele nunca teve dúvidas quanto a se sentir atraído por homens. Ser gay realmente nunca o incomodou em solo alemão até a subida ao poder do Partido Nazista e o consequente reforçamento do $175 do Código Penal alemão à época, que versa sobre “condenação à luxúria contra o que é natural”, entendendo-se luxúria como relações homem-homem ou homem-animal. O reforço se dá na substituição de “luxúria contra o que é natural” para simplesmente “luxúria”, ampliando o espectro da condenação não só para relações sexuais, mas bem como para “atos similares ou precedentes ao coito”.

Rudolf e sua enorme rede de amigos, homossexuais ou não, são pegos pela Polícia alemã por meio de denúncias, resultando na sua condenação, prisão e soltura. A reincidência no “crime” o leva ao campo de concentração de Bunchewald, destinado majoritariamente a presos políticos e inimigos do Estado alemão. Lá, Brazda recebe como símbolo um triângulo de tecido cor-de-rosa no uniforme, que o designa como homossexual – e o número de matrícula 7952. Sua vida antes e depois do campo é contada de uma maneira quase jornalística por Jean, que adiciona ainda ao depoimento fotos e pesquisa histórica.

Publicado por uma editora não pertencente ao grande circuito do mercado, O Triângulo Rosa quebra grandes preconceitos que gravitam em torno da homossexualidade. O primeiro deles é a falácia de que há mais homossexuais hoje em dia do que antigamente. Estatisticamente, tendo-se em vista a população crescente, o número é obviamente maior – mas não deixa de ser proporcional. Nosso século apenas conferiu direitos e limpou vários preconceitos concernentes à homossexualidade – mas não a proliferou ou fez qualquer outro verbete desses. Brazda é um símbolo dessa reflexão nos anos 1930, com sua vasta e porque não, atuante rede de amigos e parceiros homossexuais, nem mais nem menos escondida.

O segundo grande preconceito é o de que a homossexualidade é uma característica adquirida ou escolhida. Não pretendo nem me manifestar sobre – ou corro o risco de escrever coisas de caráter pouco cortês. A respeito do assunto, prefiro a voz de Jean e Brazda:

“A situação não vai tão bem com o diretor do estabelecimento, que odeia os homossexuais. Quando tem oportunidade, ele não deixa de insultar Rudolf em público. As sanções são arbitrárias. Para os condenados por homossexualidade, o diretor tem uma de que gosta particularmente: que os prisioneiros durmam nus nas celas individuais. Ele está convencido de que o frio acalma o desejo dos detentos [...]
“Fico revoltado quando recordo meus anos de cativeiro impostos por esses crápulas nazistas! E isso tudo por quê? Por causa dos atos considerados ‘antinaturais’. O que eles sabem da natureza? E da minha natureza, aquela que eu não escolhi?””

Seeya.
Indicação da Amanda

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