Cá estamos nós de novo. Estou escrevendo de novo – numa sexta-feira e para a Posso te indicar um livro?
Bem, para a minha volta decidi indicar um livro assinado pelo compositor Chico Buarque. No tempo ativo da página eu já havia assinado uma outra resenha sobre outro livro do Chico (que você confere aqui: http://migre.me/hRTVL) o Budapeste.
Lembro que naquela resenha atentei para a qualidade literária do Chico – é dizer – Autor e obra se distanciam MUITO naquele livro. Quando você começa a ler, pensa HÁ, é o Chico contando sobre uma ida dele e a Budapeste... E não é nada disso, o livro em primeira pessoa, cativa, e captura o leitor. O mesmo acontece em Leite Derramado (agora sim, o meu lenga lenga acabou e eu estou finalmente indicando o que vim indicar).
Leite Derramado, tem todas as qualidade que eu mencionei que Budapeste tem, com um adicional, é outro livro! E nos mostra a versatilidade enorme de Chico Buarque, é um livro bem diferente do Budapeste, e isso é simplesmente fantástico.
O Livro começa com um velhinho numa cama de hospital. Ele está conversando com a enfermeira, com a filha, e com quem mais quiser ouvir, no caso, ele está conversando mais precisamente com o leitor no final das contas, então, de inicio nós achamos o velhinho bem chato e falador, mais aos pouquinhos vamos nos afeiçoando a ele.
O velhinho é Eulálio D’Asumpção, que veio de uma família muito rica e esteve – há várias gerações – ligada a momentos importantes da história do Brasil, e é aqui que mora o grande diferencial do livro. Eulálio vai contando tudo que lhe aconteceu durante a vida, sem medo, pois como parece ele está num leito de hospital e está quase encontrando o final de sua vida. Então ele começa a lembrar o passado, e vai lembrando, sem se preocupar muito bem com a ordem cronológica dos acontecimentos. Nos conta sobre o amor por Matilde, a história do neto revolucionário que morreu durante a ditadura militar, tudo isso se costurando e conectando com o presente, onde ele nos conta sobre a filha que está atualmente cuidando dele, e como está irritado pelo tratamento que vem recebendo...
O interessante aqui é que Eulálio não está lamentando as vicissitudes de sua vida passada, ou as coisas ruins que aconteceram ao longo de sua vida, ele apenas está contando, é como um velho que está narrando sua vida, então é interessante pensar que o título do livro – como era de se esperar – faz referência sim ao famoso ditado: “Não adianta chorar pelo leite derramado”, mas vai para além disso, é simplesmente um homem comentando o leite derramado.
Eulálio é chato – sim eu disse chato – mas aos decorrer da narrativa o velhinho vai ganhando a nossa simpatia, aos pouquinhos nós vamos gostando mais e mais dele, e lá pelo meio do livro nós já esquecemos a chatice dele e nos afeiçoamos por ele, e vamos nos interessando cada vez aos causos que ele vem contando.
Outro diferencial do Budapeste, é que aqui cada capítulo é basicamente uma nova história, um novo acontecimento na vida de Eulálio, e sempre tendo como pano de fundo a história do Brasil, o que dá ao livro um sabor ainda mais especial (ainda mais para os apaixonados por história, como eu), Eulálio tece sua narrativa passando pelo Império, a primeira República, a ditadura militar e a atualidade, além de comentários sobre outros períodos e épocas do Brasil, e Chico Buarque consegue nos fazer estar por dentro disso tudo, sem didatismos, sem nada que pareça artificial.
Sim, eu já elogiei a qualidade literária de Chico, então, se tudo que eu falei não te convencer a parar tudo que você estiver fazendo e ir correndo ler Leite Derramado, falo que o livro é muito bem escrito, flui que é uma maravilha – dá pra ler no ônibus, no metrô, na rua, esperando o taxi, sentado na praça, andando no sol, se protegendo da chuva... E além de tudo nos guarda várias surpresas ao longo de sua narrativa. Não seria legal descobrir quais são elas?
A página está voltando, Espero que vocês estejam gostando então não deixem de dar o feedback. Eu volto a escrever no domingo, assinando uma crônica/coluna sobre bibliotecas, espero todos lá.
Indicação do Aion
[Ainda é cedo amor, mal começaste a conhecer a vida]
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