sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Macário – Álvares de Azevedo



“Eu sou o diabo, Boa-noite, Macário”
Álvares de Azevedo é sem dúvida um dos meus escritores favoritos. Ele está inserido na 2º Fase do Romantismo no Brasil, a fase do macabro, da melancolia, da vida curta e breve (friso que não são sinônimos). O autor morreu aos 20 anos, de tuberculose, como, aliás, aconteceu com vários daqueles poetas dessa fase tão macabra do romantismo (e uma das mais ricas), Infelizmente, Azevedo foi embora e deixou muita pouca coisa escrita. Macário é uma peça de teatro e na minha humilde opinião figura entre uma de suas melhores obras.
Macário, o personagem título, está chegando de viagem quando cruza com um desconhecido. Pelo menos essa é a referência inicial do texto, no entanto, os dois conversam como dois velhos amigos, infelizes com suas vidas, sonhadores com amores impossíveis. Álvares de Azevedo vai aos poucos fazendo um suspense em não revelar o nome do desconhecido que conversa com Macário. Toda vez que Macário pergunta quem ele é, o desconhecido foge e não responde a pergunta.

Isso dura algumas páginas, e vários monólogos se alternam entre Macário e o Desconhecido. Macário então conta sobre os seus desejos mais íntimos, sobre o seu sonho amoroso, sobre a angústia da juventude, sobre o desejo em se deitar com uma mulher. Os dois, que acabaram de se conhecer, conversam por várias páginas sobre esses assuntos. Notamos que o Desconhecido dá corda a Macário, quer que Macário fale e que ele abra seus pensamentos, seus anseios mais profundos.

Mais a frente, O Desconhecido revela ser o Diabo – o que dá a peça um tom altamente macabro, mas ainda sim, mesmo após a revelação, Macário e Satã (A partir daqui denominado assim) conversam como dois velhos amigos, chegam a falar sobre a angústia de fazer poesia, à vontade e o gosto por bebida, as mulheres, a virgindade, a vida e a morte, num desenvolvimento que é bem típico dos demais romances da segunda fase do romantismo. O livro foi publicado em 1852, e guarda a linguagem culta da época, o que dá um charme delicioso ao conteúdo.

Há ainda um segundo ato, depois da conversa de Macário e Satã, que se passa na Itália. Conhecemos Penseroso, um amigo de Macário, que como ele, está vivendo angustiado, confuso, em busca de amor virginal. Em busca, enfim, de uma vida para ser vivida. Há melancolia por diversas partes das falas de Penseroso. Na verdade, Macário é uma peça teatral um pouco melancólica, mas que traz discussões muito relevantes e importantes de serem pensadas. Curtíssima e muito rica em sua essência, sua linguagem, ousada para os padrões atuais, com o macabro de se conversar com o Diabo, e trata isso de uma forma extremamente natural.

Simplesmente um livro fantástico, assim como toda a obra de Álvares de Azevedo.


“MACÁRIO - Gosto mais de uma garrafa de vinho que de um poema, mais de um beijo que do soneto mais harmonioso. Quanto ao canto dos passarinhos, ao luar sonolento, às noites límpidas, acho isso sumamente insípido. Os passarinhos sabem só uma cantiga. O luar é sempre o mesmo. Esse mundo é monótono a fazer morrer de sono.
O DESCONHECIDO - E a poesia?
MACÁRIO - Enquanto era a moeda de ouro que corria só pela mão do rico, ia muito bem. Hoje trocou-se em moeda de cobre; não há mendigo, nem caixeiro de taverna que não tenha esse vintém azinhavrado. Entendeis-me?
O DESCONHECIDO - Entendo. A poesia, de popular tornou-se vulgar e comum. Antigamente faziam-na para o povo; hoje o povo a faz para ninguém.
MACÁRIO (bebe) - Eu vos dizia, pois Onde tínhamos ficado?
[...]
O DESCONHECIDO - Na verdade és belo. Que idade tens?
MACÁRIO- Vinte anos. Mas meu peito tem batido nesses vinte anos tantas vezes como o de um outro homem em quarenta.
O DESCONHECIDO - E amaste muito?
MACÁRIO - Sim e não. Sempre e nunca.”

Indicação do Aion

[nos perderemos entre monstros, da nossa própria criação]

Nenhum comentário: